domingo, 29 de janeiro de 2012

Festa do Enterro do Ano*

                                                                                          Por Guilherme Venâncio

O denominado “Enterro do ano” é uma festa tradicionalmente do Bairro Baraúnas, pois não foi encontrado registro de uma festa tão irreverente e singular na cidade de Feira de Santana durante a virada de ano. Este evento acontece sempre a meia-noite do dia 31 de dezembro. Dona Preta sua idealizadora se sente orgulhosa da festa, mesmo com as modificações ocorridas desde sua criação:


Eu vi a primeira vez a festa no bairro de Santo Amaro de Ipitanga [...] era assim: as pessoas botavam a várias folhas em sua porta no dia de Juda...ia acontecia que ia uma pessoa pegava um lençol branco e aí colocava as folhas, as folhas na verdade, era folhas de chá e todo mundo colocava a folha para dizer que o que foi ruim esse ano era para ir junto com as folhas, aí eu vi e falei: vou levar para Baraúna, quando cheguei aqui fiz o primeiro ano, depois, o segundo, aí ficou até hoje, as pessoas no começo não gostava muito, mas depois foi acostumando (D. PRETA, 2007).

O morador Paulo Macaco, um negro alto e vendedor ambulante, acabou acrescentando um caixão no lugar do lençol branco e um boneco no lugar das folhas de chá. Com essa mudança muitos moradores deixaram de se identificar com o festejo:

Eu fui pra São Paulo no início da década de 80, fui trabalhar lá, aí recebi uma carta, nem lembro de quem foi, .me falando que o herege do Paulo Macaco tinha mudado a festa, que tinha botado um boneco e que agora tinha caixão no lugar  do lençol branco, aí quando cheguei aqui vi que tinha mudado mesmo, aí não tinha mais como mudar de novo, o povo já estava costumado com aquilo e não gostei nunca mais gostei daquilo (D. Preta, 2007).

O que chama atenção é que durante todo o mês de dezembro começam a surgir boatos que no ano não terá a festa por diversos motivos. Um dos mais freqüentes é que quem esta na organização não mora mais no bairro e/ou que outros se tornaram evangélicos.  Porém quando chega o dia 31 dezembro, principalmente após ao meio-dia começam os preparativos. O primeiro passo é conseguir o caixão para o boneco, e que sempre é doado pela prefeitura. O segundo passo é a confecção do boneco, que é feito por marceneiros e ex-marceneiros do bairro, verdadeiros artesões com a participação de todos que gostam da festa: crianças, jovens, adultos, mulheres e homens do bairro.

Cada ano o boneco representa uma personagem diferente e a vestimenta é escolhida em função dela. Na maioria das vezes, são escolhidos os times de futebol que não foram bem sucedidos durante o ano ou político locais que não apresentaram um bom rendimento em seu mandatos. As 18h, início da noite, é colocado o caixão junto com o boneco. O bairro fica na expectativa para saber qual foi o nome escolhido pelos organizadores, pois muitos querem fazer suas observações e críticas diante da festa. Até aqueles que não concordam com os novos moldes da festa  ficam na expectativa. 

Assim que chega o caixão, as crianças são as primeiras a querer saber quem é, para em seguida espalhar dentro do bairro o título/tema escolhido. O caixão fica no meio do bairro para facilitar a visita de todos aqueles que querem observá-lo. Ao seu lado sempre é feita uma fogueira que representa o anúncio de que o "Enterro do ano" irá acontecer mais uma vez.  Com os fogos e os cânticos é anunciada a saída do caixão, que é levado pela população ao canal de macrodrenagem de águas pluviais que corta o bairro.


* Parcial do texto da monografia apresentada como conclusão do autor no curso de licenciatura em Geografia na UNEB - Santo Antônio de Jesus.

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